Aluna: Adriana Strappazzon - 2015-2

"A folha em branco me travava como travam as pernas do trilheiro diante de uma cascavel ou os olhos e a fala do tímido frente a uma câmera ligada. E, como se não bastasse, a cobra resolvia atiçar com seu chocalho e a câmera se revelava como transmissão ao vivo para rede nacional. Piorando a minha situação, a folha esperava, silenciosa, por uma redação de vestibular ou enem, chamando por um tema chato ou alheio. A agonia da página vazia me fazia adiar tentativas. E eu acabava não escrevendo.O ensinamento mais importante das aulas da Cyntia, para mim, foi o de dar esse salto. Compreender que desenhar a primeira palavra, construir a primeira frase, aquela que ameniza o barulho dos pensamentos, não é, de fato, uma tarefa fácil. Mas tampouco precisa ser tão agoniante. De um modo muito sutil a professora foi trabalhando isso em mim e eu aprendi a permitir que as ideias fossem se delineando, tocando com leveza o lápis e rabiscando a página vazia. Às vezes a folha até me sussurrava e as palavras, já menos desobedientes, vinham."
Um beijo grande!
Adri
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No cruzamento das várias histórias

Há histórias contadas que surpreendem, castigam, inspiram; há aquelas que não parecem ter sido narradas, mas vividas; encontrando-­se e se emaranhando nas memórias pessoais, nos desejos recônditos do espírito. Sobre isso, Walter Benjamin sugerira que a narrativa era como semente, que, mesmo passados anos, poderia germinar. Assim é Machado de Assis, um escultor da palavra, um suspiro no escuro, um incômodo repentino, um intruso que desperta a semente na terra alheia – em tempo qualquer.Em “Várias histórias” a essência humana é dilacerada no questionamento da crença, nas aparências do desejo, no frágil mito da nobreza da alma. Ao romper o cristal da perfeição romântica (e irreal), Machado de Assis aproxima suas crônicas das histórias que se passam na rua, nas casas, ou que se escondem no lugar infinito do segredo.Os sentimentos que transpassam as personagens machadianas, nesta obra, não são, portanto, encapsuladas pelo sublime, amparadas pelo gosto do macio. Contudo, nas imperfeições que delineiam, apresentam um ser humano concreto, marcado pela possibilidade do desencontro, pela convivência com a incompletude, pela inconsciência do anseio realizado, pela gerência do remorso, pelo apelo ao sabor da dor, pela fuga da palavra certa ou da escolha mais perspicaz.No cruzamento do ficcional com o pessoal, um desafio possível é encontrar­-se – ver no espelho da página um reflexo do próprio escondido. Afinal, no caminho da história, esta que se tenta agarrar com os sentidos, passeiam braços apaixonantes, escutam­-se ratos torturados, consultam­-se cartomantes, imitam­-se as ideias dos santos, indefine-­se no amor. E, com grande susto, o leitor se percebe uma personagem eternizada por Machado de Assis.

Adriana Strappazzon - 2015-2 - Antropóloga, aprovada em Medicina da UFSC.

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